sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Pobres que morrem como ricos

Por Stephen Leahy, da IPS

Especialistas em saúde alertam que as mortes por ataques cardíacos, derrames cerebrais e diabete, causadas por doenças crônicas não infecciosas, acabam com mais do dobro de vidas do que outras que são infecciosas, com Aids, malária ou tuberculose. Nos próximos 10 anos, cerca de 388 milhões de pessoas morrerão por causa destas doenças que podem ser prevenidas, provocadas fundamentalmente pelo hábito de fumar, uma dieta ruim e falta de exercício físico. Embora sejam considerada com freqüência “doenças de ricos”, a maioria destas mortes ocorreram em países pobres, segundo os autores de um artigo publicado na última edição da revista científica Nature.

“Enfrentamos uma crise sobre a qual poucos políticos e funcionários governamentais estão ao par”, alertou o principal autor do estudo, Abdallah S. Daar, do não-governamental Centor McLaughlin-Rotman de Toronto. Os países em desenvolvimento e as organizações de ajuda sanitária se concentram quase exclusivamente nas doenças infecciosas. “Mas isto equivale a apagar um fogo em um prédio em chamas desde o térreo até a cobertura”, disse Daar as IPS. A boa notícia é que existe uma solução fácil para prevenir estas enfermidades não transmissíveis.

“Com uma ação concertada podemos evitar, pelo menos, 36 milhões de mortes prematuras até 2015. Alguns destes falecimentos serão de pessoas com menos de 70 anos”, diz o artigo da Nature. O habito de fumar é a causa que pode ser combatida da maneira mais simples e o lugar óbvio para começar a agir, acrescenta. As mortes relacionadas com o tabaco chegam a cinco milhões de pessoas ao ano e estima-se que chegarão a 10 milhões até 2030, com a maior parte dos casos no Sul em desenvolvimento, informou a Fundação Mundial do Pulmão. Em comparação, a Aids mata dois milhões de pessoas e a tuberculose três milhões por ano. Além disso, afirmam os autores, as taxas de mortalidade se estabilizaram ou estão diminuindo na maioria dos países.

A exposição das crianças à fumaça de tabaco é “incrível” na China, Índia, Oriente Médio e outras regiões do mundo, disse Daar. Fumar afeta os pulmões, causa câncer e contamina o meio ambiente, entre tantos males que provoca, acrescentou. As empresas de tabaco, que estão perdendo terreno nos países ricos devido aos altos impostos e às campanhas de prevenção, concentram seu grande poder publicitário nos países pobres, que apenas podem fazer frente ao custo de comprar um produto altamente viciante e ao que o hábito de fumar impõe sobre seus sobrecarregados sistemas de saúde pública.

Campanhas educativas e a proibição de publicidade de cigarros são dois meios que podem ser usados para reduzir o número de fumantes. Milhões de vidas poderiam ser salvas se fossem adotadas as recomendações da Convenção Marco sobre Controle do Tabaco da Organização Mundial da Saúde. Mas, muitos países precisam de ajuda para colocá-las em prática, disse Daar. Entre as recomendações que Daar e os outros autores do artigo definem com os “20 Grandes Desafios” se encontra converter estas doenças crônicas não infecciosas em uma “prioridade política”, também promovendo estilos de vida mais sãos. Os governos também devem fazer cumprir rígidas regulamentações para desestimular o consumo de tabaco, álcool e comidas não saudáveis, acrescentaram.

A falta de exercícios está custando milhões de mortes prematuras que anularão os avanços feitos na redução das doenças infecciosas”, disse aaips Stig Pramming, diretor-executivo da Aliança para a Saúde de Oxford. “Os males crônicos não transmissíveis constituem a maior fonte de enfermidade e falta de capacidade em todos os países do mundo, com a única exceção dos da África subsaariana”, acrescentou. De todo modo, nesta região ainda há pessoas que estão consumindo mais comidas não saudáveis, tomando bebidas que contêm açúcar e não fazendo exercício físico suficiente. “Alguns morrem de doenças coronárias antes de completar 40 anos”, disse Daar.

O desafio para a comunidade internacional é levar o desenvolvimento aos países pobres mas sem as suas conseqüências negativas. Muita ênfase no desenvolvimento, sem considerar a saúde, gera situações como a que atravessa a Rússia, onde o alto crescimento da economia convive com uma redução de 10 anos na expectativa de vida, alertou Pramming. No caso dos homens russos, sua expectativa de vida caiu para 58 anos, em média, contra 72 entre os britânicos. “Se a Rússia não reverter esta tendência, sua economia também começará a declinar”, acrescentou.

Por sua vez, os Estados Unidos enfrentam uma explosão de casos de obesidade, que afetam 25% da população adulta. Se nada for feito para reverter este quadro, o custo em matéria de saúde, atualmente estimado em US$ 100 bilhões ao ano, ficará tão alto que a economia do país estará em problemas, acrescentou Pramming. Nesse país – e em todo o mundo – a comida não saudável é muito mais barata do que a saudável, por isso os pobres são os mais afetados por essas doenças não contagiosas. “Os governos têm que baratear o custo de uma dieta saudável, se necessário através de subsídios”, afirmou o especialista.

É preciso uma mudança nas políticas que favoreçam as agroindústrias e a produção em massa: “É um problema complexo, mas não particularmente difícil”, afirmou Pramming. Muitos dos passos que devem ser dados se superpõem com os necessários para enfrentar a questão da mudança climática. Por exemplo, fazer com que os alimentos frescos sejam acessíveis localmente, em lugar de confiná-los em supermercados distantes que obrigam o uso do automóvel para sua compra. “Uma vida saudável contribui para ter planeta são”, concluiu.


(Envolverde/ IPS)

Nenhum comentário: