quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Alteração milenar

Por Washington Castilhos, do Rio de Janeiro

Agência FAPESP – Apesar da falta de dados concretos sobre as causas do câncer de mama, sabe-se que cerca de 10% dos casos da doença têm fundo genético, provocados por alterações nos genes BRCA1 e BRCA2. Mas em cada país são registradas alterações distintas, tornando difícil um diagnóstico mais preciso para a doença.

Uma equipe do Instituto Português de Oncologia, em Lisboa, acaba de descobrir uma dessas mutações no gene BRCA2. No entanto, o que torna o achado importante é o fato de que o grupo também descobriu que a alteração ocorre há mais de 2 mil anos, muito antes da formação de Portugal como reino independente.

“Essa é uma alteração fundadora genuinamente portuguesa. Até agora, sabemos que 23 famílias em Portugal, uma na Bélgica, uma na França e outra encontrada recentemente nos Estados Unidos possuem essa alteração, o que significa que elas têm ancestral em comum, a despeito de pertencerem a países diferentes”, disse a médica oncologista Fátima Vaz, coordenadora do estudo, que apresentou detalhes do trabalho na terça-feira (27/11), no 2º Congresso Internacional de Controle do Câncer, no Rio de Janeiro.

Com a descoberta, Portugal passou a ocupar o time dos poucos países que têm alteração fundadora em um desses dois genes. Antes da descoberta do grupo, modificações do tipo haviam sido identificadas na Finlândia, na Rússia, na Polônia e na Espanha. Judeus ashkeniazi (com origem no centro da Europa) também têm alteração genética fundadora já identificada para o câncer de mama.

“A vantagem é que quando estudamos famílias portuguesas de origem judaica e encontramos mulheres positivas para a doença, não temos que identificar outras mutações no DNA, o que é um trabalho difícil. Vamos investigar primeiramente se existe a alteração fundadora judaica, nesse caso”, explicou Fátima à Agência FAPESP.

A descoberta, de acordo com a cientista, permitirá fazer o mesmo com as famílias legitimamente portuguesas em relação à recentemente identificada alteração fundadora portuguesa. “Isso tornará o trabalho de prevenção mais rápido, uma vez que só vamos fazê-lo com aquelas mulheres que se mostrarem positivas, isto é, que apresentarem tal mutação.”

A alteração só pôde ser identificada por meio da técnica do PCR (reação em cadeia da polimerase) otimizada. “Tivemos que fazer dois PCRs de confirmação, um em nível do DNA e outro do RNA, pois esse é o que está mais próximo da proteína. Essas mutações provocam câncer de mama porque a proteína não está funcionando bem”, explicou Fátima.

Segundo a pesquisadora do Instituto Português de Oncologia, existem no mundo cerca de 1,2 mil pessoas positivas a essas mutações, todas com ancestral português comum. Desses, já foram rastreados 80, oriundos das 23 famílias portuguesas estudadas.

Ela espera agora estabelecer comunicação com pesquisadores de outros países, como o Brasil, para investigar a ocorrência de tais alterações. “Penso que provavelmente não vamos encontrar outra alteração em Portugal tão prevalente quanto essa”, disse Fátima.

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