segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Comida viva (Globo Repórter)

Reportagem: Ismar Madeira (Campos do Jordão, São Paulo)

Prato do dia: verduras, legumes, frutas e sementes germinadas. É a comida viva!

"Eu tomava remédio para pressão e não tomo mais. Emagreci dez quilos com uma alimentação natural que qualquer um pode fazer em casa", conta o aposentado Orlando Asse dos Santos.

Não é milagre. É o resultado da orientação médica, que seu Orlando recebeu em um posto de saúde de Campos do Jordão, em São Paulo. Tudo de graça, pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Foi com o médico Alberto Gonzalez, pesquisador da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que ele e muitos outros pacientes começaram a aprender que comida é remédio.

"Há influências bastante claras na obesidade, na constipação, na inflamação crônica, na dislipidemia – que é o desequilíbrio do colesterol –, nas doenças gastrointestinais e respiratórias e no diabetes", aponta Alberto Gonzalez.

Mas, afinal, o que é comida viva? A receita é simples: nada pode ser cozido, frito ou assado. Os alimentos são de origem vegetal. E para começar bem o dia, um suco poderoso.

Se uma pessoa que não tem uma doença diagnosticada nem se sente mal resolver experimentar esse alimento vivo, que resultados vai sentir?

"É muito importante que eu, me apresentando como médico, diga que alimento vivo é bom para quem está doente, mas o alimento vivo é uma alimentação para quem está sadio e quer se manter sadio", esclarece Alberto Gonzalez.

Decidi experimentar. Em dez dias, que resultados eu veria?

"Em dez dias, vai haver uma grande liberação de água do seu corpo. Muita água retida vai ser eliminada. Você também vai notar mudanças no âmbito da digestão e da disposição, principalmente após as refeições, Você vai se sentir muito bem disposto", adiantou Alberto Gonzalez.

Doutor Alberto troca o jaleco pelo avental. Hora de arregaçar as mangas e mostrar como se prepara o suco. "O grande equipamento é um liquidificador. Depois de tudo lavado, você começa a fazer o suco. Primeiro, picota o pepino. O pepino vai para perto da hélice, porque ele é um grande gerador de água. Aí vem a maçã. Vamos extrair a água do pepino, da maçã e das verduras orgânicas disponíveis com uma cenoura. E, finalmente, as sementes de girassol germinadas. Você pode usar só trigo, girassol, quinoa, gergelim, amêndoa. O ideal é a semente germinada”, ensina Alberto Gonzalez.

Este é o grande segredo da comida viva: grãos germinados. E se você já está se perguntando como vai fazer para conseguir essas sementes, não se preocupe.

"Em seguida, coamos. Fica uma massa consistente. É um coador de voal, que qualquer um pode ter. As pessoas com mais recursos usam uma centrífuga. É o café da manhã. É bom que seja um copo grande. Tem pão, manteiga, café e leite, só que em forma natural, viva e repleta de nutrientes vivos", ressalta Alberto Gonzalez.

Não é um suco ralinho, parece um leite ou algo muito cremoso. É em um casarão que doutor Alberto Gonzalez ensina receitas de alimentos vivos. Alguns pacientes são encaminhados para o local e aprendem que, além do suco, podem fazer pratos coloridos e saudáveis, como a caldeirada de frutos do mato.

Legumes ralados, picadinhos. Basta prensar os alimentos, uma técnica feita com as mãos, para controlar a temperatura da panela. Afinal, nos chamados alimentos vivos, legumes e verduras não podem ser cozidos.

"Se começar a queimar as mãos, tem que desligar. Se não queimar a mão, não vai queimar os alimentos também", explica uma funcionária do hospital.

“A carne é uma questão de herança cultural. Eu não vou chegar em uma aldeia de pescadores e dizer: parem de comer peixe. Comam o peixe, mas incluam na sua vida os alimentos que vêm da mãe terra. Porque eles vêm com a informação que você precisa", diz Alberto Gonzalez.

"Não posso dizer que sou vegetariano. Uma vez por mês eu não recuso um churrasquinho, mas também não sou escravo da alimentação. Como tudo que eu gosto, com uma certa regra", conta seu Orlando.

"Sempre digo que tudo que é verde faz bem para o que é vermelho. Quem está com doença cardiovascular volte-se para o reino vegetal. Alimente-se de tudo que é verde possível que a recuperação cardiovascular vem a reboque", aconselha Alberto Gonzalez.

Em casa, seu Orlando segue a orientação diariamente e faz questão de plantar suas verduras: "Eu aproveito qualquer cantinho. Uma jardineirinha da loja de R$ 1,99, um pouquinho de terra e brota um trigo bonito".

A grama de trigo usada no suco nasce de sementes comuns compradas no supermercado e simplesmente jogadas por seu Orlando na terra. "Todos os espaços, o quintal do vizinho, por exemplo, eu coloquei trigo há 15 dias e já está nascendo. Temos couve e outras hortaliças espalhadas no meio da vegetação. Uso de sete a oito qualidades para fazer o suco por dia", conta.

Será que é mesmo tão fácil assim? Nos dez dias em que testamos o suco também experimentamos a preparação dele, até em cozinhas de hotel. Se eu consegui, qualquer um consegue.

Mas, antes, é bom lembrar: estávamos no restaurante de um hotel na cidade turística de Campos do Jordão, e as tentações estavam servidas. Eram 9h. Eu jantei no dia anterior, às 20h30. Ou seja, havia mais de 12 horas. O estômago já estava reclamando. A mesa do café da manhã era farta. Em vez de optar por tudo o que eu normalmente comeria, fiquei só com as frutas e o suco verde.

Logo pegamos a estrada. Acompanhamos doutor Alberto Gonzalez até a casa de um paciente. A viola dá o tom. O lavrador Benedito Vicente da Rosa leva uma vida simples. Mora com a mulher no alto de uma colina, em um lugar onde não tem luz elétrica. Mas sobram ar puro e produtos tirados da terra sem agrotóxicos. Faltava saber como aproveitar todos os seus nutrientes. Foi o que seu Benedito aprendeu nas consultas pelo SUS. Visitas periódicas fazem parte do Programa de Saúde da Família.

Há um ano, o lavrador mal conseguia ir ao posto de saúde, por causa de uma trombose na perna esquerda, uma ferida enorme não cicatrizava.

"Estava muito machucado, era uma ferida só. Tinha um roxo que parecia uma lesão só. Tomei o suco e fechou tudinho, foi uma beleza. Eu já estava até desenganado", comemora o lavrador.

Doutor Alberto Gonzalez explica: "Os vasos da perna dele não chegavam até a intimidade do tecido, por conta do problema vascular. O suco promoveu o fenômeno denominado neovascularização, de crescer novos capilares onde não tinha".

Mas o médico alerta: "Se você está usando remédios e quer mudar para o suco, consulte um profissional médico. A pessoa que tem um problema grave de pressão arterial ou problema grave de perfusão sanguínea do próprio coração não pode parar de tomar o remédio. Eu trabalho usando remédios e o suco. Os remédios vão sendo tirados à medida que os resultados com o suco vão aparecendo. E isso depende da adesão do paciente".

Seu Benedito se empenhou de verdade para ver o resultado. Afinal, o que já seria difícil na cidade grande poderia até ser impossível para quem vive sem energia elétrica – sem um liquidificador.

"Tentei socar no pilão, mas espirrou muito. Tive que inventar outro modo. Daí, foi no ralador. Achei que foi importante", diz seu Benedito, que colhe os ingredientes, rala e espreme tudo com as mãos. "É um verdadeiro remédio. A perna sarou que é uma beleza! Não tem mais nada, está forte. Já estou imaginando até jogar bola. Eu gostava muito de jogar bola. Fazer isso todo dia é difícil, mas sem esforço ninguém consegue nada".

A germinação dos grãos é que dá força ao alimento, potencializa os nutrientes. É o que garante a mais antiga pesquisadora da comida viva no Brasil, a designer e professora Ana Branco, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). A primeira semente foi ela que plantou. Há 15 anos, Ana Branco reúne conhecimentos que ela passa adiante.

Preste atenção: é o passo-a-passo para você também aprender a germinar as sementes na sua casa.

"Colocamos a semente de girassol de molho na água. Vamos dormir e a semente vai acordar. São oito horas de molho na água. É o tempo de dormirmos e ela acordar. Na manhã do dia seguinte, jogamos a água fora e deixamos escorrendo em algum apoio por mais oito horas. Depois de oito horas de molho na água e oito horas no ar, é só darmos uma lavadinha antes de consumirmos. Podemos olhar o que aconteceu com a semente germinada. Dá para ver o narizinho que está nascendo. Nesse ponto, podemos consumir. Assim, comemos a energia vital contida nela. E ficamos forte que nem ela", diz Ana Branco.

Para ela, uma filosofia de vida que germinou e deu frutos. Muitos já aprenderam os segredos da alimentação viva em cursos e em uma feira na PUC-RJ.

"Nós começamos com o suco quando eu estava grávida da minha terceira filha. Meu marido faz o suco, fazemos para a família toda. Isso já acontece há três anos", conta a professora Rosana Cunha Pinto. "O grande barato é chamar as crianças para fazerem junto com você. Pede para uma pegar uma maçã, pede para outra segurar uma hortelã. E assim a gente vai cortando e preparando o alimento junto".

Eu bebi suco durante dez dias. E não foi difícil, mesmo fora de casa, dormindo em hotéis, comendo em restaurantes. Logo no primeiro dia, eu fiz exames de sangue que mostraram que a minha saúde vai muito bem. Taxas como colesterol e glicose, por exemplo, estão ótimas. E, por causa disso, eu resolvi não mudar mais nada na minha alimentação. No almoço e no jantar, continuei comendo o que estou acostumado e gosto: arroz, feijão, carne.

Mesmo assim, substituindo só café da manhã, o suco fez efeito. Perdi 2,1 quilos. Eu também senti outras mudanças que não podem ser medidas. A primeira: comecei a sentir menos fome nos últimos dias. E a segunda: mudança no apetite. Já não tenho tido mais tanta vontade de comidas pesadas. Pode ser resultado do suco.

Imprimir

0 comentários Links para esta postagem

Notícias, Reportagens e Eventos relacionados ao Sistema Honnō de Saúde e às técnicas e terapias da antiga Medicina Oriental

Participe do I Congresso Internacional Brasil-Japão de Acupuntura e Eletroacupuntura Científica que acontecerá nos dias 17, 18 e 19 de outubro de 2008 na cidade do Rio de Janeiro.

Participação de renomados conferencistas internacionais com o objetivo de incentivar o intercâmbio técnico-científico e a troca de experiências entre profissionais de saúde do Brasil e do Japão, como também observar a evolução do uso da Acupuntura, Eletroacupuntura e outras técnicas e terapias da Medicina Oriental, no tratamento de doenças específicas e sua eficácia na prevenção de diversas enfermidades.

Eventos paralelos, workshops e mini-cursos diversos com emissão de certificados das instituições organizadoras.

Lançamento de livros como “Revolução Imunológica” do prestigiado Dr. Toru Abo da Universidade de Medicina de Niigata, Japão.

Apresentação e explanação de técnicas e exercícios do Sistema Honnō de Saúde e os “8 Caminhos de Saúde e Cura”, pelo Dr. Sohaku Bastos.

Mais informações Aqui.

Especialistas explicam os desejos das mulheres grávidas

Vontades têm a ver com falta de nutrientes e estado emocional.

De repente, no meio da madrugada, lá vem aquele desejo incontrolável. E aí surgem as vontades mais esdrúxulas e, digamos, impossíveis. Será que alguém pode explicar os desejos que uma mulher grávida tem?

“Eu acordei num sábado de manhã, chamei o meu marido e falei estou com vontade de comer cimento!”, conta Erika Arruda. Um desejo incontrolável, que ultrapassava os limites da razão. Érica até tinha medo que o cimento fizesse mal ao bebê, mas quem disse que isso era suficiente para diminuir a vontade?

“Insisti, insisti, até que o convenci. Ele subiu num muro, pegou, lavou, coloquei na boca, mas ainda tinha medo de engolir, para não prejudicar o bebê. Então, fiquei mastigando aquilo um tempão e depois joguei fora e lavei a boca”, diz Erika. “Para mim, aquilo foi iguaria dos deuses naquele momento”.

Que vontade é essa que leva uma mulher a provar coisas tão estranhas? Nos consultórios médicos, o cardápio bizarro escolhido por algumas grávidas é definido como uma compulsão e em alguns casos, pode até ter explicação cientifica.

Cenoura todo dia, a toda hora. Até aí, um desejo do tipo convencional. Mas a grávida queria mais. “Uma vez comi uma cenoura da horta, nem quis lavar, tinha um torrão de terra junto, que foi deliciosa. Eu tinha vontade até de comer a terra mesmo”, relembra a empresária Andréa Fishmann.

Os exames pedidos pela obstetra confirmaram uma teoria do tempo da vovó: Andréa precisava de ferro, tinha anemia. “Os nutricionistas tentam associar esse desejo à deficiência de, por exemplo, ferro, zinco, cálcio, selênio, que são micros nutrientes que você tem no solo. Outros estudiosos da ciência da nutrição e da ciência do solo acham que a pessoa está comendo terra para um sentido de proteção”, explica Flávio Garcia de Oliveira, médico ginecologista.

Uma pesquisa britânica feita pela internet com 2,2 mil grávidas mostrou que 75% das entrevistadas tinham desejos por comida e um terço delas tinha vontade mesmo é de comer coisas tão esquisitas quanto carvão, pasta de dentes e sabão.

“O desejo normal é por carboidratos, por manga, por jaca. Mas esse é um desejo que passa, lá pelas 3h. O desejo compulsivo, esdrúxulo, pervertido, não passa. Ele só passa a partir do momento que a grávida consome a substância”, revela Oliveira. “Não tem como você parar, a pessoa vai consumir. Já tivemos pacientes que pegavam barro e assavam em formas para comer o torrão e comiam. Elas sabiam que não podiam, mas comiam. Isso faz parte da compulsão”, complementa o médico.

Desejos à parte, a grávida precisa seguir uma boa dieta para que o bebê se desenvolva bem. Receitas simples, com ingredientes baratinhos, ajudam as grávidas a ter uma alimentação saudável, como o frango com caju e a fritada de batata doce.

"Essas duas receitas, tanto a batata doce quanto o frango com caju, são muito ricas em vitaminas A, C e do complexo B. Com certeza, para esses desejos normais, esse tipo de alimentação vai arrefecer um pouco, porque a gente sabe que a grávida gosta muito do carboidrato. Então, fazendo esse tipo de nutrição, ela vai ter um pouco menos dos desejos normais”, aconselha Flávio.

Só que nem sempre as vontades das grávidas têm a ver com a falta de nutrientes. Muitas vezes têm fundo emocional. “A paciente realmente sente o desejo eventual por alguma coisa em especial, por uma goiaba, melancia, kiwi, e não tem explicação para aquilo que está acontecendo. Inconscientemente, muitas vezes é direcionado a uma forma de ela vincular o interesse do marido a uma participação durante o desenvolvimento da gravidez”, explica Sérgio Peixoto, médico ginecologista e professor da USP.

“Ela realmente está com vontade. Mas por que resolveu ter vontade exatamente daquilo? É uma maneira estranha da paciente buscar colaboração, buscar a cumplicidade, mas não tem nada de simulação”.

A psicóloga Geise de Almeida Silva, grávida de cinco meses, queria mesmo sentir o sabor da infância quando fez os pais saírem da grande São Paulo e fazer uma viagem de 500 quilômetros atrás de um desejo. “Queria um cheese salada do sul de Minas, da cidade de Andrelandia. Eu sentia o cheiro daquele lanche e a minha boca salivava. Tentei comer um outro cheese salada, fui em alguns lugares da cidade, mas não era o gosto”, conta. “Valeu a pena buscar este lanche. Afinal, o que a gente não faz por um filho, né?”, justifica Fátima de Almeida, mãe de Geise. O marido, Douglas Felipe da Silva, reclama mas acaba cedendo. “Eu tenho uma prima, que tem um sinal em forma de moranguinho vermelhinho. Durante a gravidez, a Fernanda, que é a mãe dela, ficou com vontade de comer morango e ela nasceu com esse sinal. Mas acho que é mais superstição, né?”, diz o marido de Geise.

Superstição ou não, ninguém quer arriscar. “Na dúvida, é melhor comer o sanduíche para não ter nada de errado!”, conclui a mãe de Geise.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Paradoxo nutricional

25/8/2008

Por Alex Sander Alcântara

Agência FAPESP – O Brasil vive uma transição nutricional paradoxal. Um estudo publicado na revista Cadernos de Saúde Pública revela a prevalência crescente tanto de anemias como de obesidade no país. A pesquisa, que analisou trabalhos realizados nas últimas três décadas, aponta que essa tendência estaria associada a mudanças no consumo alimentar.

A pesquisa analisou 28 trabalhos publicados sobre anemia em crianças e mulheres em idade reprodutiva, considerando a representatividade estatística, padronização de técnicas laboratoriais e critérios recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Para o estudo do sobrepeso e obesidade, o trabalho avaliou o Índice de Massa Corporal (IMC).

Participaram do trabalho pesquisadores do Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), do Instituto Materno Infantil Professor Fernando Figueira (Imip) e do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, unidade da Fundação Oswaldo Cruz em Recife.

De acordo com Malaquias Batista Filho, do Imip, o estudo procurou se afastar do paradigma usado na maior parte das pesquisas, cuja referência é o enfoque isolado dos diagnósticos, particularmente no caso das doenças nutricionais, que são analisadas como “entidades próprias e autônomas”.

“A idéia foi juntar os dados em uma série cronológica desde 1974 para verificar se eles apontavam alguma tendência. Há três estudos que foram feitos com a mesma população em momentos diferentes, por isso são mais adequados a análise de tendências temporais. Os resultados revelam que, a cada década em que o exame foi feito, a desnutrição regrediu e a obesidade evoluiu”, disse Batista Filho à Agência FAPESP.

Embora o país venha superando o problema da fome, a nova pesquisa aponta as anemias como um problema em ascensão. Um dos estudos anteriores feito no município de São Paulo, cujos dados foram utilizados, foi o caso mais representativo: a prevalência do problema das anemias aumentou de 22% para 46,9% nas duas últimas décadas, entre as crianças menores de 5 anos.

Os outros dois trabalhos se referem aos estados da Paraíba e de Pernambuco, cuja tendência é de aumento das anemias em 10% a cada dez anos.

Batista Filho, que também é professor aposentado do Departamento de Nutrição da UFPE, ressalta que o problema da anemia não é exclusivo dos países subdesenvolvidos. A Europa tinha, segundo ressaltou, 20 milhões de pessoas anêmicas há uma década.

“Trata-se de um problema que foi progredindo na surdina, sem muitas denúncias. Hoje existem estimativas de que dois terços da população mundial podem ter anemia. Houve redução nas formas mais graves, mas houve ampliação em relação às formas leves e moderadas de anemia”, acrescentou.

Leite demais

Segundo Batista Filho, uma certa mitificação do leite na alimentação humana tem relação com o avanço da anemia. “O leite é muito importante na alimentação, mas ainda assim não pode ser considerado um alimento que necessariamente deve fazer parte da dieta para que exista condição para saúde normal. Ele não é rico em ferro e inibe o aproveitamento de ferro de outros alimentos. No estudo feito em São Paulo, verifica-se que, em grande parte, o leite está sendo co-responsável pela ocorrência de anemia em crianças”, disse.

As grandes mudanças na situação nutricional da população adulta resultaram, segundo a nova pesquisa, em um aumento do sobrepeso e obesidade. Em relação à evolução do estado nutricional, segundo o IMC, foi identificado um declínio no baixo peso e uma estabilização em níveis aceitáveis a partir de 1989, enquanto a obesidade triplicou em homens, elevando-se de 2,8% para 8,8%.

Entre as mulheres, a ocorrência de obesidade, que, inicialmente, era três vezes maior do que em homens, manteve-se praticamente estável em torno de 13% nas avaliações efetuadas em 1989 e 2003. No mesmo período, a prevalência de normalidade antropométrica, que era de 71,4% entre os homens em 1974, caiu para 47,4% na última avaliação. Entre as mulheres, a prevalência da normalidade antropométrica, segundo o IMC, declinou de 53,4% para 42,7%.

De acordo com Batista Filho, o novo paradigma nutricional gera a necessidade de se avançar para além dos problemas relacionados à fome. “Agora temos que pensar nos aspectos qualitativos da alimentação e não simplesmente compensá-la com calorias. Alimentação saudável não se reduz ao problema da fome, mas tem relação com vários outros aspectos nutricionais e de saúde.”

“Temos de retirar um pouco do centro da discussão a questão da fome em si, e colocar agora um tema bem mais amplo, que seria o da alimentação saudável para todos os ciclos de vida. Hoje, inclusive, se percebe que quando estamos cuidando da alimentação da criança estamos cuidando do escolar, da gestante, do trabalhador e das populações idosas do futuro”, reforçou.

Para ler o artigo Anemia e obesidade: um paradoxo da transição nutricional brasileira, de Malaquias Batista Filho e outros, disponível na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP), clique aqui.